Ilusão do tempo.

05:20 da manhã o celular toca, levanto sem pestanejar e sigo para o banheiro. Sento na privada com a tampa ainda abaixada e fecho os olhos por alguns segundos, no escuro . Tento sair do meu próprio transe e procuro uma toalha, abro a porta que dá acesso ao quintal e ela range, penso em porque algumas coisas não são mais silenciosas. Pego uma toalha qualquer no varal e entro no chuveiro, o box do banheiro me serve de espelho, onde me perco em meu próprio olhar. Saio do banho e vou para o quarto, ainda silenciosa. Sento na cama e vejo meu namorado dormindo de boca aberta, em um sono que parecia ser tão profundo, fiquei com dó de despertá-lo para a realidade de nossas vidas. Passo a mão em sua cabeça e ele desperta assustado, continuo a acariciar seus cabelos baixos e sorrio, '' Acorda amor, temos que nos arrumar.'' Ainda calados nos trocamos, com a cara de sono e um mau humor prestes a chegar. Antes de sairmos tomamos um chá para enfrentar melhor o dia. Na rua ele acende um cigarro e segura minha mão, o dia acaba de nascer e a luz e o vento frio da manhã me faz querer voltar para casa e dormir por mais três horas. Caminhamos mansos até o ponto, logo avistamos o ônibus ao longe, quase tão sonolento quanto nós.
Entramos no transporte apertado e abafado, com as luzes ainda acessas e trabalhadores arrumados para o inicio da jornada semanal. Fico atrás de um homem com um perfume forte que quase me faz desmaiar, penso em como é essencial  o peso e as medidas. O ônibus segue rumo ao elevado e vimos a cidade de cima, quase no mesmo nível que o Sol, que já invade as janelas e ilumina nossos rostos.
Me despeço dele e sigo para outro ônibus, sento em qualquer banco do lado da janela e fecho os olhos, ali tenho a certeza absoluta de que todos nós vivemos para o dinheiro, vivemos para os nossos empregos. O que fazemos de útil para nossa vida? Trabalhamos dez horas por dia, eu levo duas horas para chegar em casa, e tem muita gente por ai que demora muito mais. O que me questiono é sobre o tempo, que tempo temos para nós, para nossas famílias, que tempo temos para discursar, saber, descobrir e relatar?
Quando vou poder voltar a pensar, sem me sentir culpada pelo tempo passar?
Enquanto o tempo segue, em plena lucidez finjo trabalhar e me desligo da alienação que suga a vida da maioria das pessoas pelo monitor do computador, seu trabalho monótomo.
Vejo a pressa vir, e o cansaço beirar nos olhos de muitos deles, vejo a vontade de voar, a vontade de largar, a vontade de poder viver e pensar.

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